Faça parte deste projeto: envie fotografias e histórias da sua família para daravolta@icloud.com.
Esta recolha resulta de uma investigação que estamos a levar a cabo no Dar a Volta sobre o QUE NOS LIGA E NOS DESLIGA da bicicleta.
As fotografias aqui expostas pertencem aos espólios das famílias dos estudantes da FMH (dos cursos de licenciatura 2015 e 2016). Esta primeira galeria é sobre as avós dos estudantes com histórias contadas no outono de 2016 e 2017. Difícil, para todos, foi conseguir datar fotografias e histórias associadas. Agradecemos a todas as famílias a partilha dos seus espólios.
Este álbum também já contém fotografias de pessoas acompanham este projeto e que contribuem enviando fotos e histórias da própria família.

Gândara, anos 40
Primeiro a história da irmã da minha bisavó contada pela minha avó. Esta então era uma gandaresa e trabalhava na agricultura, e nessa altura (anos 40) não havia mais nenhum meio de transporte na terrinha dela, assim, ela usava a bicicleta para ir para todos os lados: Quando se queria deslocar para os terrenos de cultivo, quando ia fazer compras ou até vender os próprios produtos em feiras de outras terras, quando ia á missa ou até quando ia aos domingos fazer grandes passeios com os amigos, ou seja, fazia tudo com a bicicleta em que está montada na foto ao pé da minha bisavó! A segunda história é do meu bisavô, marido da minha bisavó que está na foto em pé, que em jeito de coincidência, também usava a sua bicicleta como meio não só de transporte mas de trabalho. Era um ourives ambulante e ia às terras e casas das pessoas sempre na sua bicicleta com um saco pendurado onde tinha o ouro e as joias, era assim que vivia dia-a-dia e trabalhou muitos anos assim. No entanto, um dia após o 25 de abril, ele tinha a bicicleta parada à porta de uma taberna e esta foi-lhe roubada, perdendo assim um trabalho de uma vida inteira, algo que o traumatizou e que fez com que nunca mais trabalhasse dessa forma, nunca mais foi o mesmo. n

Figueira da Foz, anos 50
Sobre a minha avó materna: a primeira experiência que teve com uma bicicleta foi aos 12 anos, e segundo o que conta era muito difícil terem contacto porque era um objecto caro. No entanto, ainda se recordou das seguintes histórias: – Um dia, algures entre os 12 e os 15 anos, foi dar um passeio com o seu pai, meu bisavô, junto ao Rio Mondego, com bicicletas alugadas, e atropelou uma lavadeira que levava a roupa à cabeça a pé. – Durante alguns anos, juntava-se com um grupo de amigos e iam ao stand de bicicletas que havia numa esplanada na Figueira da Foz e alugavam-nas por 30 minutos/1 hora (momento registado nesta foto); – Contou também sobre uma vez que foi a S. Pedro de Moel e experimentou uma bicicleta de uma amiga e numa descida íngreme caiu.

Lisboa, anos 50
A minha avó teve a sua primeira experiência com uma bicicleta que pediu emprestada a uma amiga, no Bairro da Madre de Deus. Não sabe ao certo a razão pela qual nunca lhe deram uma bicicleta… Assim, andava “à boleia” da sua amiga, ora ela dava umas voltas, ora deixava a minha avó dar. Referiu que foi um grande desgosto de não ter um bicicleta sua. Passado uns anos, começou a namorar com o meu Avó (Mário Esteves) que tinha uma bicicleta. Conta que davam umas voltas pela província na aldeia da Columbeira. A minha avó teve a sua primeira experiência com uma bicicleta quando a pediu emprestada a uma amiga, no Bairro da Madre de Deus. Recordou que um dia, foram convidados para uma matança de porco na Usseira. Lá foram, ambos de bicicleta. Começou a chuviscar e quando iam a descer uma estrada, cada vez a bicicleta andava mais rápido e o meu Avó bem dizia “trava, trava…”. Até que a bicicleta da minha avó saiu da estrada e foi se enfiar numas silvas encostadas a um muro. Diz que ficou tão magoada, tão inchada e tão picada… que nunca mais andou de bicicleta. A minha avó diz que, depois das experiencias que viveu percebeu que nasceu para não andar de bicicleta.

Vila Péri, anos 60
A minha avó materna começou a andar de bicicleta por volta dos seus 11 anos, em Moçambique. Aprendeu a andar sózinha utilizando uma bicicleta emprestada de um amigo, circulando sempre pelas ruas próximas de sua casa. Andou de bicicleta até aos seus 18 anos. Durante a sua vida nunca conseguiu ter uma bicicleta por questões económicas, contudo sempre desejou ter uma. Habitualmente tinha contacto com a bicicleta apenas quando um colega seu a ia buscar à escola. Uma das vezes que ia sentada na bicicleta com ele, ela pôs o pé entre os raios da bicicleta e torceu o pé e por essa razão teve uma semana sem ir à escola. Por vezes passava férias em Vila Péri (Ximoio) e tinha um tio que lhe emprestava a sua bicicleta para que esta pudesse passear pela Vila. Depois de casada, apesar de ter atualmente condições económicas, não pensa em adquirir uma bicicleta pois tem receio de andar..

Golungo Alto, Angola Anos 50
A minha avó Clara nasceu em Angola e vivia no Golungo Alto. Naquela altura não havia condições financeiras para os seus pais lhe oferecerem uma bicicleta. Foi por volta dos 13 anos que recebeu uma bicicleta de cor azul e foi o seu pai que a ensinou a andar. Depois de aprender entretinha-se a passear com os amigos e vizinhos. Quando foi para um colégio interno de freiras, estas, por vezes davam-lhe autorizaçãopara andar de bicicleta, no entanto nunca teve muito contacto com este desporto. Por volta dos 18 anos veio para Portugal, para construir a sua vida e nunca mais andou de bicicleta.

Sabugo – Sintra (anos 50)
Izilda Lopes. nasceu a 17 de Agosto de 1934, na freguesia do Socorro, em Lisboa. Ainda muito jovem, por influência dos seus tios paternos, passa inicialmente as suas férias no Estorninho (Bombarral), onde aqueles possuíam casa. Mais tarde, os seus tios mudam o seu local de férias para o Sabugo, em Sintra, motivando o seu pai a alugar uma casa nessa localidade. É com cerca de 16 anos que aprende a andar de bicicleta, na companhia de um grupo de amigas, possuindo uma delas, esse meio de deslocação. Passam a efectuar cicloturismo e passeios variados nos períodos de lazer. Por vezes, era acompanhada pelo seu irmão Mário, quatro anos mais novo. Estamos no início dos anos 50. As suas primas não têm possibilidade de o fazer, pois o pai não as autorizava. Uma mulher a andar de bicicleta, era ainda nessa época, ou motivo de troça ou de desconfiança. É a sua tia Corália que lhe faz umas calças curtas (veja-se foto) para o efeito, à semelhança das que usavam os homens. Izilda nunca chegará a adquirir uma bicicleta (era coisa para os ricos, refere). Alugava sempre uma para os passeios. Certo dia, decidem fazer um passeio até à Base Aérea de Sintra, onde Izilda chegaria a pilotar um avião, com o piloto ao lado a supervisionar e, na volta, em Algueirão, faltam-lhe os travões da bicicleta. Era ver a jovem Izilda, aflita, aos gritos; “Afastem-se, afastem-se, perdi os travões!”. Felizmente, um transeunte consegue agarrar-lhe na bicicleta e pará-la, tendo assim tal acontecimento um desfecho positivo. Passam-se os anos e Izilda pára de andar de bicicleta quando os seus pais deixam de ir de férias para o Sabugo. Começa a namorar, e o automóvel substituirá definitivamente a bicicleta. Anos mais tarde, já casada e com um filho pequeno, nos anos 60, o seu marido Eduardo lembra-se de alugar um “tandem” de 5 lugares em São Martinho do Porto, o novo local de férias da família. Izilda não consegue andar nessa bicicleta e, que se recorde, seria a última vez que o faria. O seu filho Eduardo Fernando, aprenderia a andar de bicicleta sem “rodinhas” de apoio com 4 anos de idade e, a primeira vez que o pai larga o selim, no Jardim do Campo Grande, em Lisboa, vai contra uma árvore e exclama; “A estúpida da árvore, não saiu da frente, pai!”. Uma família de ciclistas (como se vê), com o expoente máximo no seu cunhado Eduardo Lopes, o maior «sprinter» e «pistard» dos anos 40. [História recolhida pelo filho. Lisboa, 23 de Fevereiro de 2018]

Madeira (anos 60)
A minha mãe, natural do Funchal, nasceu em 1957. Fez o seu percurso académico até ao 12º ano, sendo apenas obrigatório na sua altura a 4º classe. Actualmente vive em Lisboa e trabalha com Técnica de tráfego de assistência em escala na empresa GroundForce. A sua primeira bicicleta foi-lhe oferecida pelos seus pais, quando fez 5/6 anos. Agora sim podia brincar com os seus irmãos mais velhos, que já possuíam também uma bicicleta. Estas brincadeiras eram apenas permitidas no quintal de casa e nunca na rua. Nos primeiros tempos, precisou de ter a ajuda de 2 rodas de apoio, visto que não se conseguia equilibrar na bicicleta, mas não foi preciso muito tempo para se livrar delas. Andou de bicicleta até os seus 12 anos de idade e só voltou a ter novo contacto com uma bicicleta em Vilamoura, à cerca de 5 anos atrás, pois achava engraçado e prático utilizar as bicicletas para ir à praia, à marina ou mesmo ao supermercado, visto que Vilamoura possui uma boa rede de ciclovias onde podia andar calmamente e disfrutar do passeio. Nunca utilizou a bicicleta em pequena, como meio de transporte, pois a ilha da Madeira não possui uma orografia favorável para esta prática. Hoje em dia, a viver em Lisboa, mais precisamente no Parque das Nações, é seu desejo comprar um bicicleta, visto ser um bom sítio para disfrutar dela e nunca a utilizará como meio de transporte pois em Lisboa as distâncias são muito grandes e também possuí carro como meio de transporte. Entre a adolescência e a fase adulta, nunca mais voltou a andar de bicicleta mas logo ficou a perceber porque é que as pessoas utilizam a expressão “isso é como andar de bicicleta, nunca se esquece”, pois a sensação que teve quando voltou a pegar numa bicicleta, cerca de 40 anos depois, foi de como nunca tivesse deixado de andar.

A minha avó (anos 60)
Eu nunca andava de bicicleta, porque usávamos mais o burro!