(Em recuperação)

Histórias recolhidas pelos estudantes do 2º ano da licenciatura de Ciências do Desporto (anos letivos 2017/2018), no âmbito do projeto de Sociologia do Desporto dedicado à etnografia do uso da bicicleta em três gerações. Sobre o triciclo, conseguimos um espólio de imagens superior às histórias que sobre eles se contam. No entanto, uma foto lembra outras histórias ligadas com os usos da bicicleta e são essas que aqui se publicam. Excertos retirados dos relatórios dos estudantes.

Avô, 1939

  • Histórias não sou capaz de te contar porque a memória já me falha e não me lembro de pormenores. Sei que naquela altura era-nos permitido utilizar a bicicleta em qualquer lado porque o trânsito antigamente não era como hoje e também não precisávamos de licença, algo que mais tarde começou a ser preciso. Até aos meus 12 anos andava muito de bicicleta, depois fui viver para Lisboa e deixei de andar tanto, só quando vinha a Aldeia Nova de férias. No entanto, uns anos mais tarde ganhei uma bicicleta num concurso do jornal O Século, que se chamava “Cabeças no Ar” se não estou em erro. Tínhamos de juntar as imagens que vinham diariamente no jornal e colá-las na caderneta. Quando a caderneta ficava completa ficamos sujeitos a ganhar a bicicleta. [TD2_GR8_S.B.]

Tia João, anos 60

  • A minha tia Maria João nasceu em Angola e foi lá, na Vila Luso, que teve a sua primeira experiência a pedalar, nem em duas, mas em 3 rodas. Nessa cidade os militares em serviço habitavam num Hotel reservado para esse efeito. Grandes corridas de triciclo eram organizadas entre os filhos de militares no passeio fronteiro ao Luso Hotel, sobre o olhar dos miúdos naturais do Luso que não tinham acesso a estes veículos. Em Timor a minha tia aproveitou também as condições favoráveis e dava grandes passeios de bicicleta. Esta pequena bicicleta tinha a peculiaridade de travar pedalando ao contrário. De regresso a Portugal em 1974 a bicicleta acompanhou a família, mas a urbe lisboeta não era de facto espaço “ciclável” e a pequena bicicleta acabou a sua carreira. Foi substituída por uma nova, mas a primeira utilização dela redundou num acidente. Ao tentar travar a tia Maria João pedalou ao contrário, como estava habituada e chocou contra um peão. Passaram-se 30 e tal anos e desaprendeu de andar. Quando lhe liguei por causa deste projecto referiu que se tinha lembrado dos seus momentos de ciclista pois andam a construir imensas ciclovias lá onde mora e está mesmo a precisar de fazer exercício.

Pai, 1963

  • Do triciclo só resta esta memória. Um dia, em Bissau, eu ia a andar, ia de bicicleta e tinha uma campainha e eu em vez de tocar a campainha fiz “tlim-tlim!” e cheguei a uma esquina fomos todos parar ao chão: eu, a bicicleta e uma pretinha que vinha escondida do outro lado da esquina da rua. E foi essa a história. [TD1_GR1_M.P.]

Tia com o pai, 1969

  • O meu pai sempre gostou muito de fazer exercício físico, e por isso desde pequeno começou andar de triciclo ao lado da sua irmã mais velha. Vendo as suas irmãs a andarem numa única bicicleta (a partilhar por 7 meninas – nas fotografias a bicicleta é mesma o que varia é somente a pessoa). A vontade de andar de bicicleta era tanta que a parte psicológica do meu pai julgava já saber andar; decidiu então um dia experimentar, no início com alguma ajuda mas conseguindo rapidamente aprender. Ficou tão fascinado com este lazer/modalidade, que hoje em dia vai a competições que incluem a bicicleta como o triatlo. Participou em vários triatlos sendo que num deles ocorreu um imprevisto, um atleta ao lado do meu pai, na transição da natação para a bicicleta, teve uma cãibra na perna e o meu pai ao ver o sofrimento do atleta, abdicou da competição, afastando o seu objetivo de fazer um bom tempo para o ajudar.

Tio com o pai, 1966

  • Bem, a bicicleta … a bicicleta pertence ao meu imaginário de criança e até de adolescente. Nasci numa simpática vila piscatória em Angola, chamada Baía Farta e recordo-me que tive um triciclo, foi o início da apetência para a bicicleta e onde aprendi a andar. O meu irmão era mais velho 4 anos que eu e teve uma bicicleta primeiro só que naquele tempo, as bicicletas dos rapazes tinham assim um quadro em forma de triângulo, ora eu como era pequena, não chegava ao selim, colocava uma perna no meio desse quadro para chegar ao pedal oposto e assim andava. Bem, mais tarde tive a minha própria bicicleta e aí sim era “pró” no assunto, chegava a andar sem mãos e fazer o chamado “cavalinho”, naquele tempo não se mediam perigos. Entretanto, mais tarde, já com 10 anos vim para Portugal e vivi em Tavira e por diversas vezes ao longo de muito tempo deslocava-me de bicicleta até Cabanas de Tavira, portanto uma aldeia ali próxima onde os meus pais tinham um comércio e lá ia eu pelas bermas da estrada 125 porque na altura não havia como hoje ciclovias. Então, como andar de bicicleta nunca esquece, fui crescendo e por vezes mato as saudades nas bicicletas dos meus filhos e é o meu único contacto com bicicleta atualmente.

Pai, anos 60

  • O meu pai no seu triciclo do SLB. Um dos episódios que o meu pai me referiu, quando tinha 14 anos, foi ter sido assaltado quando vinha do Liceu Camões, local onde estudava. Ele costumava ir para o Liceu, todos os dias, de bicicleta. Um dia, quando vinha do Liceu para casa, foi abordado por um “rufia” que o fez parar porque indicou que precisava de ajuda, também ele numa bicicleta, porque a corrente tinha saído. Quando o meu pai parou, para o ajudar, outro “rufia” aproximou-se por trás, empurrando-o e ambos começaram a agredi-lo. Quando o meu pai se conseguiu levantar, já ambos tinham ido embora e levado a bicicleta com eles. Já que não bastasse, quando chegou a casa ainda “levou na cabeça” por ter perdido a bicicleta. 

Pai, 1964

  • Fotografia do meu pai no seu triciclo no Porto Santo. Nascido a em junho de 1960, no Monte, Funchal. Praticava Ciclismo de estrada por lazer aos fins de semana. Recordo-me ainda de passeios que fazia com o meu pai, pela serra de bicicleta, quando era mais novo.

Mãe, 1960

  • A minha mãe nasceu em 1957. Natural de Lisboa, onde viveu durante toda a sua vida, estudou Economia na Universidade Católica Portuguesa de Lisboa. Actualmente é bancária reformada. Praticou natação, mas não se interessava pela generalidade dos desportos ao ponto de os praticar regularmente. A minha mãe diz que durante a sua infância, teve um triciclo, onde andava em casa da mãe da minha avó, perto do Castelo de São Jorge, em Lisboa. Nos seus primeiros anos de juventude, andava de bicicleta em Tibães, quando ia para lá passar férias, no jardim de casa dos meus avós. Na juventude e início de vida adulta, ia a casa dos meus avós, no Estoril, durante o Verão, onde gostava de brincar com os seus dois cães. O meu avô comprou uma bicicleta para cada uma das filhas e ensinou-as a andar de bicicleta, por volta dos 7/8 anos. Como a minha mãe tinha inicialmente medo da bicicleta de duas rodas, o meu avô arranjou umas modinhas de apoio para que tivesse sucesso e resultou. Desde então, a minha mãe passou a andar de bicicleta com enorme prazer, mas que aos poucos foi perdendo o hábito de andar de bicicleta e interessou-se mais por outras actividades. Em Lisboa, diz nunca ter tido interesse em ter uma bicicleta, pois já tinha o seu carro. Para lazer e/ou exercício físico, preferia outras actividades, tais como caminhar. Mesmo quando trabalhava no banco BPI, na Avenida da Liberdade, onde trabalhou durante a maioria da idade adulta, preferia ir de carro. Era mais rápido, cerca de 15 minutos e tinha estacionamento livre, pelo que não havia justificação que convencesse a minha mãe a ter uma bicicleta para mobilidade. Além disso, não havia condições (ciclovias, espaços abertos com terrenos planos) para transportar uma bicicleta de Alvalade até a avenida da Liberdade e não seria prático, uma vez que a minha mãe normalmente carregava muito peso na mala. Mesmo se houvesse, imagine-se, se as obras que se prosseguem actualmente na zona do Marquês e Saldanha tivessem estado concluídas, a minha mãe diz que não escolheria ir de bicicleta, mas sim ir a pé ou de metro.

Avó, 1938

  • Quando era pequena morava numa rua a descer e então eu levava a bicicleta até lá a cima, onde vivia o Afonso, e depois vinha a descer a fazer o avião! O avião era ir a andar deitada na bicicleta com as pernas esticadas no selim! Depois vinha para cima, que era o que custava mais. Nessa altura também sabia andar sem mãos, como é óbvio. Mas a pior história que tenho foi quando parti a perna, mas nunca cai de bicicleta! Eu estava parada com a bicicleta à mão e a falar com uma amiga minha que estava na janela em casa e sem saber o que aconteceu tropecei e cai para o lado contrário da bicicleta. Como as bicicletas eram em ferro, bati com a perna e parti a tíbia em três sítios! Quando cheguei ao hospital fiz uma radiografia e quando o médico foi ver a radiografia a minha mãe não percebia se o médico estava a olhar para ela ou para a radiografia, porque ele era estrábico. [TD2_GR8_S.B.]

Pai, 1964

  • Sobre o triciclo só existe a memória material desta fotografia.
  • Viagem à ilha de Porto Santo no ano de 1989: o meu pai fez uma viagem à ilha de Porto Santo e, dado ser uma ilha, era propícia à utilização da bicicleta como meio de transporte, principalmente naquela época em que o uso de automóvel era raro e nem todos os habitantes possuíam um. O meu pai conheceu toda a ilha praticamente de bicicleta e era esse o meio de transporte que utilizava para se deslocar diariamente. Três amigos e um blog no ano de 2013 O meu pai e dois amigos, também eles amantes de BTT, juntavam-se aos fins de semana, normalmente aos domingos, para andar de bicicleta. Faziam caminhos de estrada e de terra, perto da serra e visitavam locais com paisagens agradáveis e trilhos apropriados para a prática do BTT. Certo dia criaram um blog onde passaram a partilhar informações sobre os vários passeios que faziam, fotografias dos locais que visitavam e alguns filmes. Por motivos profissionais um dos intervenientes do grupo, por ser piloto, foi trabalhar para os Açores e o grupo naturalmente acabou por se extinguir. Link do blog: http://sempreparados.webnode.pt/filmes/
  • História durante uma prova de duatlo do meu pai em 2014 O meu pai durante um duatlo militar que englobava prova de corrida inicial de 5km e de seguida 30 km de BTT e que terminava com mais 2km de corrida, partiu a clavícula no final da prova de BTT. Depois disso ainda correu os 2km que restavam com mais uma peripécia: além de correr com a clavícula partida, na transição da bicicleta para a corrida, para não perder tempo, acabou por apertar mal os ténis e terminou parte da corrida a correr descalço.