Cicloturismo, um valor por descobrir
PORTUGAL JÁ É UM PAÍS DE CICLOTURISMO
Realizou-se no dia 6 de maio a segunda etapa do projeto Dar a Volta entre Setúbal e Sines. Chegar ou partir de Setúbal de transporte público. Sines teve comboio entre 1936 e 1990, um ramal com muitas deficiências que ficou sempre aquém da oferta rodoviária, no que diz respeito a horário de serviço e tempo de viagem.
A etapa mostrou que Portugal já é um país de cicloturismo. No caminho parámos todos aqueles que seguiam na nossa direcção para poder lhes fazer o retrato.
A maior parte dos cicloturistas segue por rotas lineares e não circulares pelo que está dependente dos transportes públicos para se deslocar. As cidades situadas no percurso do comboio Inter-Cidades que transporta bicicletas estão em vantagem sobre todas as outras.
Nesta etapa o principal obstáculo à participação de quem nos queria acompanhar foi a não existência de transporte de volta tanto de Sines como de Odemira.
O destino de 74% dos cicloturistas é a Europa. No contexto dos países europeus somos dos poucos que oferece temperaturas amenas a maior parte do ano e que tem, ao longo do território, maior diversidade de paisagem. Só a título de comparação, a viagem ao longo do Danúbio na parte alemã, feita por uma das maiores ciclovias europeias, tem trajetos de monocultura intensiva de quilómetros e quilómetros: ora milho, ora tabaco, ora cereais. Esta etapa entre Setúbal e Sines é um bom exemplo da dita diversidade.
O QUE SABEMOS SOBRE OS CICLOTURISTAS QUE VIAJAM EM PORTUGAL?
Na travessia para Tróia encontrámos um casal holandês, ele com 65 e ela com 64 anos, ambos reformados. O casal começou a viagem em Lisboa – onde chegaram de avião com as respectivas bicicletas e alforges. Íam atravessar Portugal com destino a Pau, uma vila francesa além Pirinéus. O casal seguia a chamada Rota Lusitânia que passa por Alcácer do Sal, Évora, Redondo, Vila Viçosa, Estremoz e Elvas para, depois, atravessar Espanha.
Este casal corresponde ao que já se sabe sobre o perfil dos cicloturistas:
- realizam percursos diários de 60 a 70Km
- demoram 4 vezes mais a percorrer a mesma distância que o turista comum consumindo 4 x mais refeições, dormidas, serviços, etc.
- a maior parte dos cicloturistas tem elevado capital cultural e económico
- os gastos turísticos são pulverizados por todo o território e não apenas nos grandes centros urbanos.
Na estrada para Melides encontrámos um casal brasileiro, ele com 30, engenheiro de automação, e ela com 28 anos, gestora de empresas. Oriundos de Florianópolis, tinham aterrado em Lisboa com as suas bicicletas para fazer cicloturismo em Portugal e Espanha.
Da viagem que já tinham feito, de Lisboa até aqui, perto de Melides, consideram Portugal um paraíso para fazer cicloturismo. Para o casal, é seguro viajar de bicicleta, as estradas são muito boas e, para além disso, têm sentido um respeito manifesto por parte dos condutores para com os ciclistas.
Este casal brasileiro é um bom exemplo da diversidade que, de certo, caracteriza a população cicloturista que viaja por Portugal. A média de idades dos cicloturistas europeus fica acima dos 55 anos. Em França e na Alemanha há muitos casais com pouco mais de trinta anos a viajar com filhos pequenos. Neste caso a segurança da via coloca-se com mais acuidade mas nestes países existe uma rede de ciclovias extensa que cobre praticamente todo o território.
Logo depois encontrámos um casal suíço, de Luzerna, ele com 62 anos, médico neuro-pediatra, ela com 63, investigadora na área das ciências médicas, já reformada. Estavam a fazer a Rota EuroVelo 1 e queixaram-se de tudo um pouco: da falta de sinalização da Rota, da falta de segurança da via por terem de circular na mesma estrada que os automóveis, do perigo que é circular nestas condições. As rotas de Eurovelo que já haviam realizado na Europa eram sempre vias segregadas ao transito automóvel, exclusivas à circulação das bicicletas e com sinalização vertical a indicar a direção a seguir ao longo de todo o percurso.
Duas conversas com dois casais distintos produziram duas imagens completamente diferentes de Portugal. Para os brasileiros o paraíso para os cicloturistas. Para os suíços, uma rota não marcada, logo a começar em Lisboa porque não há indicação sobre onde começar o percurso. A avaliação resulta obviamente de quadros de referência distintos mas, relativismo à parte, aquele que nos interessa seguir é o dos restantes países europeus.
Acabámos todos juntos almoçar em Melides. O casal suíço decidiu só tomar uma bebida e seguir para o pic-nic que já haviam planeado à beira mar. Após o almoço, no desvio de Santo André encontrámos uma placa indicadora do EuroVelo, um caso único digno de registo.
Em comum: consideram que todo o tempo que passam na estrada é tempo de viagem. A deslocação não é tempo perdido (como acontece com outro tipo de viagens).
Sublinhamos três singularidades do cicloturismo:
- O País deixa de estar espartilhado em ilhas turísticas.
- Todo o percurso tem valor turístico.
- Todos os caminhos, muitos deles abandonados, devem ser encarados como vias importantes de desenvolvimento turístico.
Logo, é importante ter percursos seguros, fáceis de encontrar porque bem marcados e, em suma, úteis a quem viaja de bicicleta.
Ao ver-nos, um grupo de nepaleses que estava no café, também com as suas bicicletas, juntou-se para tirarem uma fotografia. O interlocutor tinha 30 anos, no grupo as idades variavam entre 25 e 28, e dois deles com 35 anos. Trabalham na agricultura numa herdade ali perto há dois anos. Este grupo usa a bicicleta como meio de transporte e, durante o tempo de lazer, para irem até à praia e ao Badoca Safari Park que fica ali perto.
Por último encontrámos um jovem português de 25 anos, arquiteto. Seguia viagem pela costa portuguesa tendo como destino final Marrocos. Costuma fazer passeios de bicicleta com os pais e o problema é a mãe não conseguir “ter pedalada” para os acompanhar em distâncias mais longas. Viu através dos nossos exemplos – pessoas da geração da mãe a fazerem grandes distâncias de bicicleta eléctrica – uma possível solução para o problema.
MELIDES A SINES SEM SEGUIR PELA AUTO-ESTRADA
Chegar a Sines de bicicleta é uma aventura para a maior parte dos ciclo-turistas porque as estradas nacionais desembocam em auto-estradas. O casal suíço que encontrámos, primeiro, perto de Melides e, depois, já na baía de Sines, entrou na cidade como quase todos o fazem: seguindo pela berma da auto-estrada A 26-1.
É no nó crucial, onde a A26-1 deixa de funcionar como estrada nacional e passa a ser auto-estrada, que tem de ser colocada placa a indicar Sines. Até isso acontecer os ciclo-turistas, como aqueles que encontrámos, seguem em frente, pela auto-estrada, porque não há alternativa devidamente sinalizada.
Sines, em particular, faz parte da rede europeia Eurovelo 1 e tem atualmente um fluxo de cicloturistas europeus muito considerável. Todos, sem distinção de nacionalidade, mesmo os portugueses, acabam por entrar em Sines seguindo pela berma da auto-estrada porque a nacional (uma auto-estrada transformada), de repente, deixa de ser EN e passa a Auto-estrada. Ora, não existindo qualquer indicação sobre como chegar Sines os cicloturistas fazem 11km na berma da auto-estrada. De repente, já perto de Sines, encontram uma ciclovia que, dada a segurança e a orientação, instintivamente seguem indo dar à baía.
A ciclovia existente como que legitima o percurso realizado na berma da auto-estrada porque dá-lhe continuidade. A existir, e devidamente sinalizada, devia estar no fim do percurso que entra na cidade evitando a berma da auto-estrada – o azul. As ciclovias que não indicam no seu começo a direção que tomam ou o nº de km que servem são percursos cegos. A maior parte destas ciclovias isoladas servem apenas o lazer de fim de semana, nomeadamente a quem corre ou anda a pé. Para andar de bicicleta, para promover o cicloturismo, é necessário uma rede de ciclovias S.U.F.: Seguras, Úteis e Fáceis de encontrar e de seguir.
A última parte do caminho até Sines não é evidente mas encontra-se com facilidade. É uma trajeto bonito e seguro que termina na área comercial de Sines. Dali à baía apanha-se o transito habitual de uma pequena cidade.
SERVIÇOS DE APOIO EXISTENTES
‣ Alojamentos e Restaurantes onde nos guardam a bicicleta – SIM
‣ Interligação com os transportes públicos (comboio e autocarro) – NÃO
‣ Locais de informações específicas sobre rotas – NÃO
‣ Aluguer de bicicletas – EUROPCAR
‣ Oficinas de bicicletas – SIM
KOMOOT
Mapa e perfil da etapa recolhidos através da Aplicação que utilizámos para planear todas as etapas.